Quem pensa que a bicicleta não foi feita para enfrentar longas distâncias não sabe o que está falando. Acostumado a pedalar, o pediatra mineiro Sérgio Cabral foi do Camboja, onde trabalhava para uma organização humanitária internacional, para o Vietnã em apenas oito dias. Da experiência, ficaram boas lembranças da acolhida do povo khmer e a vontade de viajar de “magrela” muitas vezes mais.
“Viajar de bicicleta é um pacote completo e barato, é uma associação de exercício físico e mental, é ecológico e é mais proveitoso do ponto de vista do turismo”, defende o médico. Em entrevista ao Projeto 1 Carro a Menos, ele conta como se preparou para enfrentar estradas em más condições e viver grandes aventuras.
Você poderia ter feito sua viagem de ônibus ou avião. Por que escolheu a bicicleta?
Viajar de bicicleta é um pacote completo e barato. É uma associação de exercício físico e mental, é ecológico e é mais proveitoso do ponto de vista do turismo, do contato com o ambiente, sua transformação visual ao longo da viagem e o contato com as pessoas. Ao chegar ao destino, já se viu e aproveitou muito de muitas coisas. Além de que muitas coisas inusitadas podem acontecer durante a viagem, algumas costumam ser agradáveis e outras mais duras, mas todas trazem uma boa experiência de vida.
Foi sua primeira viagem de bicicleta? Se não, quais outras?
Já fiz várias viagens de bicicleta. Em Cuba, fiz muitas viagens em bicicleta, sendo a maior delas de uns 600 km. No Brasil, quando adolescente, costumava pedalar sem planos ou para ir a alguma cidade mais próximas.
Quanto tempo durou a viagem?
Eu havia planejado cruzar a fronteira do Camboja ao Vietnã no primeiro dia de viagem, mas como atrasei na saída o tempo ficou curto e eu voltei à cidade onde estava baseado (Takeo). Parti novamente no dia seguinte pela manhã, bem cedo, e pude cruzar a fronteira no mesmo dia. A viagem durou uns oito dias.
Qual tipo de bicicleta você escolheu?
Uma bicicleta de 15 marchas, com garupa para levar a bagagem e algumas ferramentas. Bicicleta de pneus largos. As de 10 marchas e de pneus finos costumam ser mais rápidas e mais leves, mas são menos propícias para viagens onde não se conhece a qualidade das estradas.
Como se preparou para a viagem? Comeu algum alimento especial?
Na verdade levei uns sachês de comida usada para nutrição especial (hipercalórico, com conteúdo protéico e vitamínico), mas minha alimentação básica era feita em restaurantes ou na casa de pessoas que me acolhiam. A comida no Camboja e no Vietnã é pouco calórica, pois eles comem muito vegetal. É saudável, mas para viagens deste tipo é necessária a ingestão de bastante caloria e de líquidos, principalmente água. Na verdade, muitos dos pequenos restaurantes que parei para comer pelo caminho não cheguei a pagar pela comida, pois as pessoas me acolhiam e me ofereciam a comida de graça.
Quanto à preparação física, não fiz nada muito especial, já andava de bicicleta com frequência, inclusive sempre ia trabalhar de bicicleta. Também fazia corridas longas, e exercícios físicos. Alguns dias antes fiz uma viagem longa dentro do Camboja, na região sul. Além da preparação física, acho importante a preparação psicológica. Estar preparado para dificuldades, para contratempos, cansaço e frustrações também é muito importante.
E para a bicicleta? Fez alguma modificação especial?
Não modifiquei a bicicleta, mas fiz, eu mesmo, uma revisão geral, alinhamento das rodas, regulagem dos freios, lubrificação geral, calibragem. Para viagens ou esporte, a bicicleta deve estar funcionando bem e com peças adequadas, pois isto garante o bom rendimento, tranqüilidade e, sobretudo, a segurança.
Na verdade eu não tinha uma bicicleta para a viagem e pedi emprestada a bicicleta de um amigo belga. Na bicicleta dele havia uma cadeirinha para carregar criança e não foi possível retirar. O ideal seria colocar o bagageiro sobre a roda da frente da bicicleta, mas eu não tinha material para fazê-lo. O que me fez carregar a mochila nas costas grande parte do tempo, o que não é adequado.
Em média, quantas horas pedalou por dia?
Sempre começava o dia bem cedo e parava no final da tarde, algumas vezes na entrada da noite, mas não pedalava o tempo todo. Alguns dias, pedalava mais, outros menos, dependendo do que ia encontrando pelo caminho. Não viajo na intenção de percorrer muitos quilômetros, mas na intenção de absorver ao máximo a experiência vivida. Poder parar para apreciar uma paisagem, para ter contato com algumas pessoas, tirar fotos, comer com tranqüilidade, faz parte da viagem. Quando viajo assim, não me sinto em uma competição. Por isso não economizo tempo de deter-me por algum momento que me traga prazer ou uma experiência positiva. O objetivo era justamente este e não o de percorrer a maior distância possível. E a bicicleta nos dá esta chance, particular, de muito contato com os momentos, locais e pessoas que vão passando por nós... ou nós por elas.
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
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